Mais de 8,5 milhões de usuários já tiveram WhatsApp clonado no Brasil


     Principais prejuízos são vazamento de conversas e golpes envolvendo depósito.  Criminosos pedem para usuários acionarem senha enviada por SMS e, a partir da confirmação, apropriam-se de perfil
     A crocheteira Odette Castro, 63, recebeu a informação de que uma amiga teve a conta de WhatsApp clonada e, por isso, excluiu o contato dela de um grupo no aplicativo. Os demais integrantes passaram a perguntar por que Odette tinha feito aquilo, e a própria amiga a questionou em uma conversa privada. Odette respondeu que ficara sabendo que ela teve o celular clonado, mas a amiga disse que já estava quase tudo resolvido – ela precisava apenas de um código que Odette receberia via SMS para atualizar o aplicativo. A crocheteira enviou o número, mas, do outro lado da tela, estava, na realidade, o golpista, e Odette teve também a própria conta clonada.
      Mais de 8,5 milhões de brasileiros já foram vítimas de clonagem do WhatsApp, segundo uma pesquisa realizada em 2019 pela PSafe, empresa especializada em segurança de celulares. Só em janeiro deste ano, estima-se que mais de 198 mil pessoas sofreram o golpe no país. Segundo o levantamento, o vazamento de conversas privadas é o principal prejuízo da clonagem, citado por 26,7% dos entrevistados, seguido do envio de links com tentativas de golpes para outros contatos (26,6%), pedido de dinheiro a amigos (18,2%), perda da conta no aplicativo (18,0%) e chantagem (10,5%).
     Para Odette, foi só transtorno: o golpista se passou por ela e passou a pedir depósitos bancários a diversos contatos. Uma amiga próxima da vítima chegou a transferir R$ 980 para a conta indicada pelo fraudador. “Ele falou que, no dia seguinte, transferiria o dinheiro de volta. Essa minha amiga também teve o telefone clonado, e o irmão dela depositou R$ 2.800 na conta do clone. É um golpe muito sutil. Eles abordam pessoas muito próximas, tentam imitar nosso jeito de falar”, afirma Odette. “É algo que causa constrangimento. As pessoas acham que nunca vão cair, mas pode acontecer com todo mundo”, completa. Ela registrou um boletim de ocorrência e recuperou a conta após entrar em contato com o suporte do app.
     Para clonar uma conta, o golpista usa, indevidamente, o número do celular de outra pessoa para criar um cadastro no próprio aparelho. O WhatsApp envia um código de liberação de acesso ao telefone da vítima. Para conseguir esse número, o fraudador abusa da criatividade e, com diferentes argumentos, induz a vítima a enviá-lo.
     No ano passado, os sites de compra e venda tornaram-se um meio comum para a realização da clonagem. Os golpistas acompanhavam os anúncios postados e entravam em contato com o responsável, passando-se pela equipe do site, alegando que precisavam da confirmação de um código para dar continuidade ao atendimento ou garantir segurança à transação. Ao informar o número recebido via SMS, a pessoa tinha o aplicativo clonado.
     "Após a clonagem, o mais comum é se passar pela vítima e contatar familiares e amigos simulando uma situação de urgência para pedir depósitos. Também acontece de o fraudador encontrar algo confidencial da vítima e fazer chantagem”, diz o diretor do dfndr lab, laboratório especializado em segurança digital da PSafe, Emilio Simoni.
      As redes sociais também são fontes do golpe. A partir de uma reclamação sobre uma loja, o golpista cria um perfil falso da empresa e fala com o consumidor que vai resolver o problema dele se ele confirmar um código. Também existe a clonagem a partir de convites de festa, quando os fraudadores enviam mensagens dizendo que, para confirmar presença ou ter o convite liberado, é preciso validar o código.

    Fraudador finge cobrança de cartório
    Golpistas estão enviando mensagens com falsas cobranças e ameaças por meio de SMS, WhatsApp e e-mail em nome de cartórios de protesto em Minas Gerais, segundo o Instituto de Protesto – MG. Os criminosos dizem que, se a vítima não pagar uma dívida, terá o débito protestado. As mensagens terminam com uma proposta de negociação, com valor, telefone de contato e nome de uma falsa empresa de cobrança – às vezes, com número de código de barras ou de uma conta para depósito.
    A tabeliã e associada ao instituto Raquel Garcia ressalta que nenhum cartório entra em contato com devedores por telefone, e-mail ou aplicativo. “O cartório intima de três maneiras: vai pessoalmente ao endereço da pessoa, envia carta com aviso de recebimento, e, quando o devedor não é encontrado, o comunicado é feito por edital eletrônico. O devedor sempre tem três dias úteis para comparecer ao cartório e se informar sobre a dívida antes de ser protestado”, explica ela.
     Raquel ressalta que os contatos e os endereços de todos os cartórios de protesto do Estado, onde dívidas podem ser consultadas, estão no site protestomg.com.br. “Os golpistas falam que, se a pessoa não depositar até tal hora, terá a dívida protestada. Fazem ameaças, dizendo que ela pode ser presa, perder a casa, e isso não existe. Não tem por que sair correndo para pagar”, afirma. Quando uma dívida é, de fato, protestada, a principal consequência é a restrição ao crédito.

Jornal O tempo / Rafaela Mansur